Ter uma crise, pra mim, é sentir que não tem lugar no mundo pra mim, que todos os meus amigos tem outros amigos e coisas pra fazer melhores e mais importantes, e que eu nunca vou ser amada ou respeitada como os outros são.

É sentir a minha cabeça ser bombardeada de pensamentos ruins, de ideias de que as pessoas que eu amo estão confabulando pra me ferir, que as pessoas que eu amo estão - naquele momento - reclamando e falando mal de mim pra outras pessoas que elas amam mais. Que eu sou a opção de todas elas. O resto. O tapa buraco. Que elas não vão me aguentar, que se eu pedir ajuda vão julgar como drama, como tentativa de chamar atenção. Que eu vou puxar elas pra baixo, ou atrapalhar as rotinas delas, ou que eu só vou incomodar.  Mesmo que isso seja a diferença entre me matar e seguir adiante, entre me ferir e só chorar, entre respirar fundo e entrar em overdose: mesmo com tudo isso, dói e assusta só cogitar falar sobre isso com alguém, e isso tudo se repete o tempo todo a cada letra que eu digito e a cada frase que eu falo, como uma porra de um painel de néon gritando como eu sou fraca e devia parar de incomodar.

É sentir meu coração apertar de doer e acelerar de me tirar o ar enquanto os meus olhos enchem de lágrimas e minha visão fica turva e desfocada porque eu preciso sair de onde eu estou, porque eu preciso me isolar, porque eu preciso me machucar. É perder o foco e a concentração porque tô usando toda a minha mente pra não fazer nenhuma merda, ou porque eu tô maquinando um jeito de fugir - ou pior: de me machucar ou me matar -. E ao mesmo tempo a minha mente grita em um milhão de vozes o quanto todos vão me julgar se eu sair, o quanto vão me julgar se eu chorar, o quanto eu sou fraca e ruim e egoísta e incapaz.

Mil vozes gritam que eu devia morrer, e mais mil insistem que elas estão certas, mesmo quando eu já tô rouca de tanto tentar gritar contra, e a minha garganta arranha e dói, mas eu preciso continuar, porque parar é perder essa luta. É me deixar levar por elas. E isso é caminhar pra morte.

E eu quero pedir ajuda, mas eu não consigo. Eu quero pedir ajuda, mas minha cabeça grita que eu vou incomodar, eu quero pedir ajuda mas os pensamentos inundam e transbordam me fazendo achar que é egoísmo, que ninguém se importa, que tá todo mundo ocupado demais pra me socorrer, mesmo que um pedaço da minha alma e do meu coração se agarram em todas as memórias boas que eu tenho e me façam tentar dar avisos e pedir ajuda de forma indireta e estúpida porque eu tô usando toda a minha capacidade mental pra processar tudo que tô sentindo e ouvindo.

E aí eu me machuco. Um beliscão, não, não é o suficiente, eu mereço sentir mais dor, eu mereço sofrer, pelos deuses por que eu não me sinto no meu próprio corpo?! Por quê?!
Um arranhão. Um soco. Um tapa. Uma contusão.

E quando eu volto a me sentir, volto a sentir dor e a controlar o meu corpo, às vezes é tarde demais, e eu já me feri e me rasguei e me fiz sangrar como pude. É como um viciado que quebra a casa em busca de algo pra usar sem que consiga se controlar, e quando volta a si já é tarde demais. E mesmo que tentem me impedir, eu entro em desespero, porque meu deus eu não mereço ficar bem, eu preciso sentir dor, eu mereço passar por isso, eu preciso de algo que me faça voltar pro meu corpo porque senão eu vou me perder. É como se eu sentisse a minha alma se descolando do meu corpo e indo embora devagar, como se eu fosse morrer se não me machucasse.

E depois vem culpa e vergonha. Eu me sinto um lixo por não ter segurado a onda, eu me sinto a pior amiga e a pior pessoa por ter assustado outras pessoas, eu sinto que devia sumir da vida de todo mundo pra ninguém mais ver esse lado monstruoso e sombrio, pra eu nunca mais incomodar ninguém e poder ceder à próxima crise.

E  é assim. É sempre assim. Eu começo a me recuperar e a pensar que, ei, talvez as pessoas entendam, talvez eu seja só paranoica, talvez eu seja merecedora de amor também. Mas minha cabeça discorda.

E tudo vira uma bomba. Qualquer palavra que pode ter um sentido ruim vai ter - com certeza, ninguém se importa comigo, eu sou um lixo, por que não seria a pior interpretação? -, mesmo que eu grite e racionalize e peça ajuda. Qualquer atitude duvidosa ou vacilo vira uma âncora que me puxa pra baixo quando eu acabei de voltar pra superfície e tô sem força nenhuma pra me salvar, repetindo esse ciclo até o dia que eu não vou mais aguentar.

Assim eu vivo sempre fraca, cansada, desanimada. Minha mente não funciona, nada me dá prazer, eu não consigo lidar com as pessoas. Porque eu tô ocupada demais lutando pra não ceder ao meu lado ruim, eu tô lutando pra não me afogar, eu tô exausta de nadar pra superfície com uma âncora que fica cada vez mais pesada.

Às vezes tudo que eu preciso é parar. É ter alguém pra cuidar de mim, pra me lembrar do básico,  pra me deixar descansar e me recuperar de tudo de ruim, pra que eu tenha forças pra sobreviver ao novo ciclo.

Não é frescura. Não é fraqueza.

É o pior inferno que pode existir, e eu vivo nele o tempo todo.

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