Apr 12, 2016 2:13pm
[ TW: GORDOFOBIA ]

Sobre o vídeo que tá rolando por aí, com a cena da série My Mad Fat Diary, onde ela conversa com o terapeuta:

A gente, mulher gorda, tenta se amar, de verdade, dia após dia.

A gente procura outras mulheres gordas que sejam lindas e sejam consideradas padrão de beleza. E muitas vezes elas não nos contemplam, porque tem uma cintura fina, um peso bem distribuído, peitos grandes, ou são brancas, ricas e de olhos claros.

Então a gente procura outras mulheres gordas empoderadas pra tentar se empoderar também. Sabe, procurar inspiração, procurar apoio, procurar... esperança.

E um dia a gente acorda e fala "sabe, foda-se tudo isso, eu vou me vestir do jeito que eu gosto". A gente se olha no espelho, com um short ou uma calça mais justa, ou um vestido que não esconda as dobrinhas das costas.

E fica insegura.

Pensando que, sabe, aquilo é errado. Porque a gente passou a vida inteira ouvindo que aquilo é errado. Que a gente não pode. Que nós somos seres horríveis e precisamos nos esconder da luz do dia como se fossemos causadoras de atrocidades impronunciáveis.

E aí a gente ri de novo e diz "porra, foda-se isso também, é nóia minha"

Mas não é só paranóia. É experiência de vida.

Porque quando a gente sai do quarto, a mãe, a irmã, a tia, o marido, o namorado, provocam.
"vai sair com essa roupa? você não tá muito gorda?"

Porque a gente sai com as amigas, e senta pra tomar um milkshake, e escuta "nossa, é por isso que tá desse tamanho", "já experimentou uma saladinha?", "isso não vai te fazer mal?"

E ri, mesmo morrendo por dentro. Mesmo sentindo vontade de jogar a bebida - ou a comida - fora naquele momento, por vergonha.

Porque a gente aprendeu que isso é normal, e aguentar esse tipo de abuso faz parte, porque a gente é gorda e ninguém vai amar a gente.
Então pelo menos precisamos ser simpáticas. Submissas.

No fim do dia você sai pra dançar, e um cara ri na sua direção e na direção das suas "amigas". E você, numa esperança meio utópica, ri de volta. E ele faz cara de nojo e ri de você com os amigos.

E depois disso, você vira piada. Porque "tá se achando". Isso quando não escuta mais uma ofensa, na lata: "tá rindo por que, o baleia? Olha pro teu peso, ninguém te quer!"

Depois disso tudo, a gente não aguenta e vai pra casa, deixando as amigas, a festa, tudo. Vai chorando. Chorando escondidinha, no táxi ou no ônibus, tentando esconder o corpo que o vestido mostra.

Se maldizendo porque decidiu se amar uma vezinha. Se maldizendo por todas as vezes que comeu um pouco mais, correu um pouco menos, dormiu até mais tarde.

Se odiando.

E chegando em casa a gente se isola, na vergonha, no medo, no ódio.

Às vezes a gente chega em casa e come alguma besteira, como todo mundo que teve um dia ruim. Porque muitas de nós não tem mais nenhuma fonte de felicidade a não ser a serotonina liberada pela comida.

Mas aí a gente escuta mais.

Escuta que "se não sair, ninguém vai te querer"

Que "precisa se arrumar melhor"

"Emagrecer um pouquinho"

Porque, "poxa, seu rosto é tão bonito".

Então é mais, é muito mais do que um pensamento pessoal. É mais do que como eu ME vejo. É uma agressão diária, de todos os lados, disfarçada das motivações mais nobres, mas que não passa de preconceito.

Esse é o nosso dia a dia.

Eu ainda sou branca, alta, rica. Tenho dinheiro pra mandar fazer roupa do meu tamanho, se eu quiser, e pagar uma psicóloga pra tentar superar minhas nóias. Ainda tenho um namorado que me ama, me apóia, e nunca saiu do meu lado nos últimos oito anos, mesmo depois que eu fiquei quase 50kg acima do peso que ele me conheceu.

Mas e quem não tem?


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